24 de abr. de 2015

Minha casa, tantas casas por Pablo Rodrigues.

Este texto "Minha casa, tantas casas" de Pablo Rodrigues, é sempre bom ler e ouvir, ainda mais com a narração do grande filho acolhido por esta cidade, José de Abreu, que aqui viveu por um grande período nos anos 70. Zé Abreu sentiu tudo isso, que só quem esteve ou passou por aqui sabe como é. 

Dedico esta postagem a todos que por aqui passaram e nasceram e hoje estão longe fisicamente mas perto de coração. Nunca é de mais parabenizar Pablo Rodrigues por suas palavras que mostram realmente o grande sentimento que os pelotenses sentem por sua cidade. 





Minha casa e tantas casas

― Digo ao senhor, sem o receio qualquer de errar: minha cidade é minha casa, o lugar onde me encontro. E crescem em mim incontáveis alegrias, abrem-se em mim inúmeras janelas quando volto pra lá: coração no compasso do mais certo. Aliás, o tanto e quanto mais sei e testo nesta vida de entreandanças é que tudo é viagem de volta... Minto? A saudade então não é a cada instante a sempre-presença? Ai, e tem maior que a saudade da casa da gente? Pois repito, para que não sobre assombro: minha casa é minha cidade. Toda doçura.
Essas lindas moças todas e suas finas feições e caminhares e perfumes são minha cidade: o crescer da lua, na Lagoa dos Patos, o inesperado irromper do amor. Lhe conto que não há nada igual no mundo. O senhor vá no Laranjal, comigo confirme, constate com os seus próprios olhos. E ponha o coração à larga. Depois sonhe com aquilo quando sonhar, toda a vida.
Uma casa e tantas casas, minha cidade, onde Ramilonga se fez canção, poema e estética profunda de frio, solidão e amor. Sim, minha cidade em mim não sei como, não saberia ser quando, onde quer que fosse, onde?, se não em mim, o que me faz mais eu: assim, minha casa e tantas casas, assim, aberto à esperança de tantos milagres e povos.
Olhe, veja - e me escute mais do que estou lhe dizendo. Escute cada pedra, cada árvore, cada banco de praça. Escute cada flor lilás dos jacarandás-em-dezembro da Coronel Pedro Osório, o silêncio das peças de xadrez, as mesas, os velhos senhores tão sempre donos do tempo, como se num quadro. Eternos. E Deus por todos os cantos. 
Escute o cheiro de infância que ainda circula pelo Café Aquário: um desejo enorme de debater o mundo com os amigos. Mudam-se apenas os assuntos. Todos somos crianças, porém, lá no fundo. O senhor faça o teste: pare diante do espelho e se olhe fixo, por cinco minutos. O que verá no fim? Pois lhe digo: um rostinho de menos que menino, como se pedisse ainda - toda a vida - o carinho, o colo e o cheiro da mãe. Mais: como se pedisse mais amor. 
Só o que me consola é a minha cidade e todas as suas belezas. 
Ah, subir pela Princesa Isabel, a mais bonita das ruas e ver as folhas caídas naquele chão de tanta história! Chegar à praça Coronel Pedro Osório... Como definir ao senhor?: o exato da beleza de se estar olhando para o chão e de repente erguer os olhos e topar com o Grande Hotel... ali, imenso, desde sempre, de portas abertas, um convite à elegância. 
Sei, certos momentos não são definíveis. Fosse lhe dizer mais, o tanto que minha cidade cultiva, muito mais conversa precisaria. O Sete de Abril e seus delicados contornos, as charqueadas que estão aí para dar testemunho, sal e sangue, luta e memória. 
O senhor preste toda a atenção no enorme da voz do Joca e saberá do que falo: raízes. 
Minha cidade é toda a alegria e beleza do mundo, mesmo quando a vida anoitece. Tholl em festa, o senhor sabe o que lhe digo. Como dizer ao senhor o encantamento de caminhar distraído pela Lobo da Costa e começar a ouvir o crescer dos violinos e violoncelos da Orquestra Filarmônica e os timbres das muitas vozes do Coro de Música pela Música? O Guarani guarda tantas histórias! 
E o que dizer então das histórias que guarda o Instituto, Casa do Capitão, minha casa... Blau Nunes mora ali! e ainda ensina a vida aos mais novos, patrício menos avisado do essencial do cotidiano, a esperança e a luz de Deus por todos os lados, de muitas onças. 
Como dizer ao senhor o tanto que minha cidade é? 
Desconheço. 
Sei e digo, apenas, que minha cidade é o que há de melhor em mim, a parte mais minha, o que em mim mais profundo habita. 
Em qualquer lugar: minha casa, sua casa, esta casa, Pelotas. 


*Este texto foi uma homenagem do Diário Popular ao 197 anos da cidade de Pelotas, que parece ser uma homenagem eterna a cada pelotense.


Fonte do texto: http://pelotascultural.blogspot.com.br/2009/07/poema-de-amor-por-pelotas.html

3 comentários:

  1. Olá .
    Realmente, quando falamos em Pelotas estamos falando de nossa casa, de nosso lar e ao ler "palavras" e "nomes", como Guarani, Lobo da Costa, Pedro Osório, Laranjal, muitas outras; centenas, que não estão neste belo texto surgem em minhas lembranças, e apesar das décadas que estou fora de Pelotas, as sinto como se andasse por esses lugares, sentindo o cheiro, a brisa, a umidade, o calor e o frio. Enfim Pelotas continua entranhada em minhas lembranças, boas e ruins, mas lembranças vivas.
    Lembranças que não se apagam.
    Afinal, é Pelotas.

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  2. Estou ha 40 anos fora, nasci em Bage mas desde meus 8 anos vivi la. Me sinto pelotense, tive minhas 3 filhas. Uma lembrança muito forte q tenho foi do carnaval. Obloco aguenta se puder, eram os soldados do quartel, que quando entravam na quinze parecia que o mundo vinha abaixo. Nao. Perderia hj, pra SAO PAULO E RIO DE JANEIRO, em materia de emoçao, alegria.

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  3. Obrigado pelo seu comentário Oraide Peverada. Que bom que o blog pode trazer esses belas recordações, esse é o intuído. Abraço e tudo de bom!

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